Em se tratando de investigação de paternidade, o processo deve pautar-se pela busca da verdade real, possibilitando a maior amplitude probatória possível. Isso pode incluir, no caso de o suposto pai já ser falecido, a exumação do cadáver para coleta de DNA.
Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso em mandado de segurança ajuizado contra a determinação de exumação dos restos mortais do senador Arnon de Mello, nos autos de uma ação de paternidade.
A ação foi ajuizada ainda em 2006 por um homem que, hoje aos 47, quer confirmar se Arnon de Mello é seu pai. Ele alega que sua mãe, que era telefonista da Telebrasilia, teve um caso com o senador em 1974, que resultou em seu nascimento.
Arnon de Mello morreu em 1983. Desde a propositura da ação, o autor encontrou muita resistência por parte dos filhos do senador, que se recusaram a fornecer material genético. Foi o que motivou o Ministério Público do Distrito Federal a pedir a exumação do cadáver.
A ordem foi conferida pela 2ª Vara de Família do Paranoá. Contra a sentença, o ex-presidente da República Fernando Collor de Mello, filho de Arnon de Mello, impetrou o mandado de segurança, por entender que o exame feriria o direito à dignidade humana, que permanece válido mesmo após a morte.
Segundo Collor, se o investigado vivo estivesse, “estaria inquestionavelmente resguardado de qualquer tentativa de obtenção compulsória de seu material genético em razão de sua dignidade, então por qual razão esse mesmo procedimento compulsório poderia ser realizado após a sua morte?”.
Relator no STJ, o ministro Paulo de Tarso Sanseverino observou que ao pretenso filho é absolutamente lícito usar de todos os meios legais e moralmente legítimos para descobrir quem é o pai, conforme permite a Lei 8.560/1992.
Explicou que a jurisprudência do STJ é vasta ao indicar que, nessas ações, o juiz não deve medir esforços para determinar a produção de provas na busca da verdade real, pois o objetivo é exercer direito personalíssimo indisponível e imprescritível.
É por esse motivo que a corte editou a Súmula 301, segundo a qual a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de. DNA induz presunção da paternidade. A norma foi positivada também na Lei 8.560/1992.
Com isso, concluiu que a recusa dos filhos de Arnon de Mello em se submeterem ao exame de DNA, apesar de constituir importante indício, não pode conferir valor absoluto para confirmar a paternidade no caso concreto. Com isso, cabe a exumação do cadáver do senador.
“A dificuldade probatória no presente caso é evidente, considerando o tempo transcorrido, uma vez que os fatos remontam ao ano de 1974 e é possível que não haja pessoas que se recordem dos fatos alegados”, disse. “Nesse cenário, dificilmente conseguiria a parte autora suprir com outras provas a conclusão que espera obter com a perícia exumatória.”
Em juízo de ponderação dos interesses envolvidos, segundo o ministro Sanseverino, o direito do autor à identidade biológica deve prevalecer sobre a tutela jurídica post-mortem da personalidade humana e do respeito ao corpo humano e à sua memória.
“Não há porque retardar ainda mais a entrega da prestação jurisdicional, notadamente em se tratando de direito subjetivo pretendido por pessoa que se viu privada material e afetivamente de ter um pai, ao longo de 47 anos de uma vida, na qual enfrentou toda a sorte de dificuldades inerentes ao caso”, concluiu.
Fonte: Conjur
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